27 abr As cores nas obras de Antonio Peticov: aproximações com Jung em sua obra “The Psychology of Kundalini Yoga”
por Irene Gaeta
Resumo
Este artigo busca fazer uma leitura da obra de Antonio Peticov à luz da psicologia analítica. Jung considerava a imaginação como uma das principais funções da psique, isto é, ela é a expressão direta da atividade vital e uma forma pela qual a energia psíquica manifesta-se na consciência. É pela fantasia que o homem é capaz de lançar-se em um processo de simbolização, de maneira a tornar-se um criador inesgotável de novas possibilidades culturais. A psique, ao encher-se de imagens em um fluxo contínuo, dá amplitude à experiência exterior. Desse modo, a obra de Peticov emerge como uma fotografia do inconsciente, revelando seus aspectos pessoais e coletivos. Contextualizada dentro de um tempo histórico, ela nos fornece uma leitura do movimento de seu tempo, do zeitgeist, ou seja, do espírito da época, e pode também ser prospectiva, nos indicando o que está por vir.
Descritores: Psicologia analítica, arte (psicologia), símbolos.
Introdução
A arte, como linguagem metafórica, não tem limites, pois os símbolos nunca se esgotam, trazendo sempre perspectivas mais amplas à complexidade da existência.
Há um mistério, dentro e fora de nós, que nos antecede e nos ultrapassa.
Necessitamos mais do que nós para saber de nós mesmos e de nossas vidas. As manifestações artísticas, assim como os sonhos, nunca são totalmente expressas na linguagem racional; elas apelam para sensações, vivências e aspectos que relacionam nosso mundo interno e externo e possibilitam criar, confirmar e explorar significados. Refletir sobre essas manifestações, deixá-las emergir, colocar-se diante delas são modos de entrar em contato consigo mesmo em uma dimensão estética e lúdica.
Carl Gustav Jung e Antonio Peticov são dois grandes desbravadores do inconsciente e cada um em sua especialidade apresenta elementos comuns e pontos de convergência. Ambos compartilham a genialidade de trazer o céu para terra. Talvez esse fato se dê em decorrência de ambos terem tido um pastor como pai. Ou seja, para eles os mistérios da vida povoam suas almas desde a tenra infância.
O trabalho de Peticov é tomado de intuição, entremeado de geometria, especialmente, a sequência de Fibonacci e a razão áurea (Fiori, 2012), também chamada de “divina proporção”, que representa perfeição e a harmonia, além de expressar movimento, pois mantém-se em espiral. Para compreender melhor o alcance das obras do artista, vale saber que a razão áurea pode ser encontrada na proporção dos seres humanos e em inúmeros outros exemplos que envolvem a ordem do crescimento, como coelhos, caramujos e constelações. É a proporção que rege a fachada do Parthenon, as plantas de templos egípcios, os quadros de Piet Mondrian e os afrescos de Rafael. Trata-se de um equilíbrio estético universalmente conhecido – um fenômeno da mente – que todos sentem, mas só iniciados e profissionais treinados podem perceber conscientemente. O eterno fascínio da estrutura oculta das obras de arte. Seu valor numérico aproximado, chamado de “phi” ou “número de ouro”, é de 1,618 e revela a simetria de todas as coisas. Por exemplo, se você medir a altura do seu corpo e dividi-la pela altura do seu umbigo até o chão, o resultado será 1,618. Tudo é regido pela divina proporção. Há indícios que apontam que sua descoberta se deu na Grécia Antiga; sabe-se ainda que ela é aplicada nas artes desde a Antiguidade.
Antonio Peticov é um visionário que exprime a esperança iluminada da alegria e, por meio de sua obra, reflete o espectro da luz.
Carl Gustav Jung (1875-1961), psiquiatra e mentor intelectual de Peticov, também fez referências à interpretação do significado das sete cores que, no espectro eletromagnético, compõem a parte visível ao olho humano. O trabalho de
investigação da psique realizado por Jung foi visceral; com sua experiência, estudo e intuição criativa, ele construiu sua vasta obra.
A imaginação é uma das principais funções da psique – ela é a expressão direta da atividade vital e a única forma pela qual a energia psíquica manifesta-se na consciência. É pela fantasia que o homem é capaz de lançar-se em um processo de simbolização, de maneira a tornar-se um criador inesgotável de novas possibilidades culturais. A psique, ao encher-se de imagens em um fluxo contínuo, dá amplitude à experiência exterior.
Desse modo, a obra de Peticov emerge como uma fotografia do inconsciente, revelando seus aspectos pessoais e coletivos. Contextualizada dentro de um tempo histórico, ela nos fornece uma leitura do movimento de seu tempo, do zeitgeist, ou seja, do espírito da época, e pode também ser prospectiva, nos indicando o que está por vir.
Arquétipos e o espectro eletromagnético
Jung (1946/1991) fez uma analogia entre o arquétipo e o espectro eletromagnético: o polo infravermelho sinaliza o instinto e o polo ultravioleta, o espírito. O arquétipo envolve, por assim dizer, desde uma camada instintiva até, na outra ponta do espectro, a camada espiritual, a imagem. Jung (1946/1991) desenvolveu um modelo para exemplificar a correlação dos instintos com os arquétipos, o do espectro da luz. O espectro luminoso tem, em seu extremo, abaixo da cor vermelha, a região do infravermelho e, acima do violeta, o ultravioleta – ambas as regiões são invisíveis ao olho humano. As imagens arquetípicas, quer apareçam em sonhos, em fantasias ou em produções psicóticas, ocupariam a região do ultravioleta; os instintos e padrões de comportamento equivalentes estariam na região do infravermelho. O arquétipo está presente na região do ultravioleta como imagem; na esfera do infravermelho, como padrão de comportamento ou instinto correspondente.
O arquétipo e o instinto constituem opostos da mais extrema polaridade, mas, como acontece entre todos os opostos, há uma relação tão estreita entre eles, que não se pode fazer uma colocação, ou mesmo pensar nela, sem a correspondente negação. Assim também, no presente, o adjetivo psicoide quer significar que o arquétipo ocupa em seus aspectos mais profundos uma posição quase-psíquica e, ao mesmo tempo, quase-material, uma posição intermediária entre psique e matéria.
O modelo luminoso da correlação imagem arquetípica-instinto é útil para a compreensão da noção de arquétipo psicoide. Jung (1946/1991) relacionou arquétipo e instinto porque, para ele, a afinidade entre os dois é total. O arquétipo seria a imagem do instinto. Psicologicamente, porém, como imagem do instinto, o arquétipo é um alvo espiritual para o qual tende toda a natureza do homem; é um mar em direção ao qual todos os rios percorrem seus acidentados caminhos e, ao mesmo tempo, é o princípio formador da força instintiva e por isso o motivo da cor
violeta, na analogia, o azul que se mistura ao vermelho, aparecendo o violeta. É a natureza paradoxal do arquétipo. Jung (1946/1991) afirmou que a natureza do arquétipo não pode ser designada precisamente como psíquica, devido à inacessibilidade à consciência do arquétipo em si.
Jung (1946/1991) propôs o conceito de arquétipo a partir da observação de temas típicos bem definidos, presentes tanto nos mitos quanto na literatura universal e que se repetem em sonhos, imagens, fantasias, delírios e alucinações de todos os indivíduos e em todos os tempos. O arquétipo em si constitui um fator psicoide que pertence, por assim dizer, à parte invisível, ao polo infravermelho ou ao polo ultravioleta do espectro psíquico. Os arquétipos em si são inacessíveis à consciência, são matrizes que se manifestam revestidas por nossas vivências pessoais que assim as humanizam.
Não se pode conhecer completamente o arquétipo, tampouco esgotá-lo, já que ele é a manifestação da energia psíquica que se evidencia nos comportamentos e nas experiências básicas e universais da humanidade: nascimento e morte, casamento e separação, maternidade, paternidade, criatividade. Por ter forte carga energética (númem), a imagem proveniente do arquétipo impressiona e fascina, podendo possuir o ego. Tal fato torna-se evidente, por exemplo, durante uma crise emocional ou em momentos de êxtase ou inspiração.
As manifestações do arquétipo podem percorrer todo o espectro luminoso, desde a matéria (vermelho) até o espiritual (violeta).
Cores e símbolos na obra de Peticov: aproximações iconográficas tântricas
Peticov, em sua obra “The New Master” (Figura 1), parece apontar para o mistério da vida, quando a janela se abre: qual arquétipo será humanizado? O que o céu trará para a terra?
O arquétipo é um “vir a ser”, uma possibilidade que pode ser mobilizada e adquirir uma determinada forma. Nunca sabemos exatamente o que a vida nos reserva.
Questionamos, portanto: qual a faixa do espectro luminoso será dominante? Em que lugar estaremos na escada da obra “Scala Cromática”, de Peticov? No início da jornada? No meio? Ou já teremos chegado ao final? (Figura 2).
O diálogo entre Antonio Peticov e Jung está vivo: por um lado, Peticov retratando todo o mistério da vida e, por outro, Jung descrevendo os mesmos mistérios através das várias culturas por ele estudadas.
Em sua obra “The Psychology of Kundalini Yoga: Notes of the seminar given in 1932”, estudando a anatomia do corpo sutil através dos chakras (Figura 3), Jung (1932/1996) os considerou, do ponto de vista da simbologia, imagens primordiais do inconsciente ou as matrizes impensáveis de nossas ideias, portanto, condições, a priori, da imaginação, algo como órgãos psíquicos.
Jung (1932/1996) considerava cada um dos chakras como representações simbólicas dos diferentes centros ou padrões de consciência, constelados sequencialmente durante o processo de desenvolvimento. Os chakras inferiores
referem-se ao desenvolvimento do ego; o chakra cardíaco, à metanoia; e os superiores, ao estabelecimento do Self, como centro da psique total.
A cosmogonia tântrica (Feuerstein, 1989) é baseada em livros anônimos, escritos aproximadamente entre os séculos VII e XV da era cristã, que preconizam a realização espiritual por meio de rituais, cujos princípios estão presentes, entre outras religiões, no hinduísmo e no budismo. Nela, entende-se que o percurso do desenvolvimento humano pressupõe o despertar da Kundalini, através de seis centros principais – jornada que equivale ao processo de individuação.
Daí, infere-se que o conceito junguiano de individuação pode ser aplicado ao corpo sutil, representado por rodas de condensação de energia, chamadas chakras – pontos focais para delinear e transmutar a energia dos corpos sutis em forma utilizável. O próprio Jung entendeu assim (Gaeta & Pacce, 2008) e assinalou que cada chakra está associado a um elemento, do mais grosseiro ao mais sutil.
Outro ponto de vista para explicar a série de chakras seria a evolução da matéria grosseira para a sutil, matéria psíquica, a ideia de transformação dos elementos da terra para o éter (Jung, 1932/1996).
A representação dos chakras na iconografia tântrica se dá pelas mandalas. À forma, acrescentam-se também as cores. Na Figura 3, gostaríamos de chamar atenção para as cores de cada chakra, em um percurso que vai do vermelho, ou seja, a representação das forças ctônicas; passa pelo laranja, tornando-se mais sutil; até chegar ao branco, que representa a totalidade da transformação inicial: um processo do ctônico ao intuitivo.
Distinguimos sete cores básicas e elas têm um significado semelhante em qualquer parte do mundo e em qualquer época, sendo o roxo associado ao espírito e o vermelho à matéria.
A utilização do espectro é outra característica marcante no trabalho de Peticov
Inúmeras telas do artista destacam-se pelo uso das cores e refletem seu encantamento com o fato de a luz branca ser o conjunto de todas as sete cores, descoberta feita e demonstrada por Isaac Newton (Fiori, 2012). Esse fascínio do
artista está nitidamente ilustrado em suas obras.
A obra de Peticov e os chakras
Os sete chakras principais são os pontos focais para delinear e transmutar energia.
O chakra tem a forma de um vórtice que é criado por dois sistemas de energia entrelaçados. Assim, o percurso de desenvolvimento humano na cosmogonia tântrica pressupõe o despertar da Kundalini e seu desenvolvimento através de sete centros, de sete chakras principais, um processo que equivale ao processo de individuação.
Peticov, em “The Trip in the Moon” (Figura 4), insinua essas possibilidades de desenvolvimento humano – o “vir a ser”, o tornar-se. Uma imagem artística daquilo que Jung denominou processo de individuação.
Ativar o inconsciente significa, portanto, despertar o divino, a devī, a Kundalinī, a fim de dar início ao desenvolvimento da consciência, visando a reativar a luz dos deuses.
Jung(1932/1996), através das cores dos chakras, afirmou que o desenvolvimento da psique também pode ser visto quando aplic ado ao corpo sutil, representado por sete rodas principais de condensação de energia ou chakras. Os chakras estão também associados a um desenvolvimento que vai do mais denso ao mais sutil. O pensamento hindu que descreve a transformação dos elementos da t erra para o éter.
Para Jung (1932/1996), o instinto de individuação pode, de certa forma, ser encontrado em todo o ser vivo, pois todo o ser vivo busca sua unicidade. No entanto, no ser humano, a individuação só acontece quando estamos conscientemente mergulhados no processo. Partindo do princípio de que Mūladhara é a raiz, a terra sobre a qual estamos, estes elementos deveriam, necessariamente, constituir o mundo consciente; se aqui estamos e se aqui estão
os quatro cantos da Terra, nós estamos na mandala da Terra.
O impacto que Peticov nos causa em sua obra em “The Masters of the Sun” (Figura 5) nos liberta: Mūladhara não aprisiona, podemos transitar ao infinito, podemos ascender ao céu e assim a matéria (Mūladhara) não seria a restrição. E o que quer que digamos de Mūladhara, é uma verdade válida para este mundo, material. É o lugar em que a humanidade é vítima de impulsos, instintos, inconsciência, de participação mística.
O próximo chakra, Svadhisthana (cor laranja), retrata o inconsciente, simbolizado pelo mar. E, no mar, existe um enorme leviatã que nos ameaça com a aniquilação.
Segundo Jung (1932/1996), o diafragma representa a superfície da Terra e atravessá-lo nos coloca na posição verdadeiramente humana, pois, pela primeira vez, ficamos em pé sobre o planeta. Ao invés de seguirmos nossos impulsos, neste estágio, começamos a criar um certo cerimonial que nos permite chegar a uma desidentificação de nossas emoções, assim como à possibilidade de superá -las.
No Anāhata Chakra, tornamo-nos Purusa: o Homem Supremo, a essência do homem. O assim chamado homem primordial torna-se visível.
O ego está na tarefa do Mūladhara, nosso primeiro chakra, bem distante desse quarto centro. Já o Self expressa um processo impessoal, a vida torna-se maior porque já não se trata de viver a própria vida, mas sim uma vida plena em que o todo é contemplado, em que já não há a separação entre o eu e o Self, como São Paulo expressou: “Não sou mais eu que vive, é o Cristo que vive em mim” (Jung, 1932/1996).
Ao retratar o arco-íris, símbolo de união entre o céu (Ajna) e a terra (Mūladhara), em sua obra “Gratitude” (Figura 6), Peticov aponta para toda esta cosmogonia: a conexão entre céu e terra, entre ego e Self. Trazer o céu para a terra equivale a transformar o mundo, possibilitando novos horizontes, trazendo a esperança e a fé de dias melhores: a transformação humana.
Jung (1946/1991) denominou esta conexão como “função transcendente”. Contudo, esta não deve ser entendida como algo metafísico, mas sim como uma função que, por sua natureza, pode ser comparada à função matemática de igual denominação – como a proporção áurea na obra de Peticov. Este, com sua arte, materializa através do espectro de cores a função transcendente descrita por Jung.
Segundo a tradição talmúdica (Becker, 1992), o arco-íris foi concebido na tarde do sexto dia da criação. Na mitologia grega, configura a encarnação da mensageira dos deuses, Íris; na mitologia germânica, constitui a ponte Bifrost que liga Asgard (Becker,1992).
Se percorrermos a história da simbologia do arco-íris, remontando ao início da tradição literária, encontramo-lo também na literatura babilônica, relacionado aos símbolos dos zodíacos. Em obras apócrifas, diz-se que Deus disparou a seta do arco das nuvens, ou seja, Deus despejou as águas destruidoras do dilúvio, que vieram das janelas superiores do céu. Após o dilúvio, Deus colocou um arco-íris no céu como representação do sinal de sua aliança com os homens. Em representações medievais, Cristo está sentado no trono sobre o arco-íris. Como o Todo Poderoso, em toda sua glória.
Com base na divisão tripla proposta por Aristóteles, no Cristianismo, com frequência, distinguem-se apenas as três cores fundamentais, símbolos da Trindade: o azul, a água do dilúvio ou origem celeste de Cristo; o vermelho, futura queima do mundo ou Paixão de Cristo; e o verde, o novo mundo ou a atividade terrena de Cristo (Becker,1992).
A imagem do chakra Anāhata nos mostra dois triângulos entrelaçados: um triângulo com o vértice apontado para cima, representando o elemento masculino, Śiva; e outro apontando para baixo, expressão do feminino, Śakti. O poder do masculino e do feminino, como expressão da vida erótica, surge pela segunda vez no âmbito dessa transformação. A primeira encontra-se no chakra básico (Mūladhara), traduzindo o mundo dos fenômenos (Sansāra), o primeiro obstáculo a ser superado.
Já aqui a polaridade masculina-feminina conjuga-se no amor carnal; os desejos e emoções ainda impedem nosso percurso.
No centro cardíaco, o linga já não representa os princípios masculino e feminino, mas sim a consciência. Essa força tem aqui a função de inspirar, de guiar, de conduzir a energia para cima.
Por outro lado, a psicologia do Manipūra chakra (o terceiro centro) está associada às emoções, ao fogo das paixões, e está bem próxima de nós, exigindo que sejamos polidos com as pessoas, a fim de evitar as explosões do Manipūra.
Para Jung (1932/1996), temos nossa cultura em Mūladhara (representado pelo vermelho). Podemos desenvolver nossa consciência até que ela atinja o centro Ajna (superior), mas, nosso Ajna é pessoal, estando, portanto, em Muladhara. No âmbito dessa perspectiva, Jung asseverou que estamos sentados em um buraco, na pélvis do mundo (espectro vermelho). Nossa cultura representa o consciente mantido prisioneiro em Muladhara.
Peticov, com sua obra, presenteia-nos com a cosmogonia universal, com seu universo pictórico do espectro das cores, conduzindo-nos do mundo ao infinito, trazendo uma libertação através da possibilidade de desidentificação egoica. Sua obra invariavelmente nos eleva acima de nossa humanidade, possibilitando-nos, com efeito, vislumbrar a própria iluminação.
Na análise de uma obra, Jung utilizou-se do verbo dual alemão “geschehen lassen” – em francês, “laisser advenir”; em inglês, “to let happen” -, que significa deixar acontecer. “Deixar acontecer” implica também deixar-se impressionar, permitir que a obra se apresente diante de você e em você, dar-lhe espaço e, então, abrir sua percepção e sua consciência para que as impressões, as sensações e os sentimentos venham, gradualmente, à superfície.
Jung (1961) assinalou que o símbolo autêntico aparece apenas quando há necessidade de expressar aquilo que o pensamento não consegue formular ou que é apenas adivinhado ou pressentido, e é este o propósito das imagens.
Uma obra de arte, porém, não é apenas um produto ou derivado, mas sim uma reorganização criativa, justamente daquelas condições das quais uma psicologia causalista queria derivá-la. A planta não é um simples produto do solo, mas um processo em si, vivo e criador, cuja essência nada t em a ver com as características do solo. A obra de arte como expressão do inconsciente coletivo pode buscar a correção de uma atitude unilateral da consciência coletiva de uma época. Quando a obra de arte extrapola os complexos pessoais do autor, ela passa a ser veículo por meio do qual o arquétipo apresenta-se, ampliando a consciência coletiva. A transgressão que Peticov imprime em suas criações subverte a realidade subjacente do indivíduo, desvelando novas possibilidades, onde luz e trevas coexistem e revelam um novo matiz.
Referências
Becker, U. (1992). Dicionário de Símbolos. São Paulo: Paulus.
Fiori, O. (2012). As imagens de Peticov e o registro dos sonhos. In I. Gaeta, M.
Catta-Pretta, Sonhos e arte: diário de imagens (pp. 25-35). São Paulo: Primavera
Editorial.
Gaeta, I., & Pacce, M. R. (2008). Psicologia analítica: aproximações kundalini yoga
e o despertar do amor através dos chakras. Revista Hermes, 13, 49-59.
Feuerstein, G. (1989). Yoga: the technology of ecstasy. Los Angeles: Tarcher.
Jung, C. G. (1961). O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Jung, C. G. (1991). A natureza da psique (OC, V. 8/2). Petrópolis, RJ: Vozes.
(Trabalho original publicado em 1946).
Jung, C. G. (1996). The psychology of kundalini yoga: notes of the seminar given in
1932. Princeton: Princeton University Press. (Trabalho original publicado em 1932).
Conflito de interesses: A autora declara não haver nenhum interesse profissional ou pessoal que possa gerar conflito de interesses em relação a este manuscrito.
Minicurrículo: Irene Pereira Gaeta ‒ Analista didata do Instituto Junguiano de São Paulo (IJUSP); membro da Associação Junguiana do Brasil – AJB; filiada à International Association for Analytical Psychology – IAAP/Zurich. Doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP; mestre em Gerontologia pela PUC/SP; especialista em Práxis Artísticas e Terapêutica: Interfaces da Arte e da Saúde pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; arteterapeuta formada pelo Instituto Sedes Sapientiae. Psicóloga.